Via Oral


Um blog sobre textos, aforismos, arte, literatura, arquitetura, humanismo e outras coisas para as quais ninguém dá a mínima. Escrito em encenado nas poucas horas vagas que a atividade de ADA (Arquiteto Doméstico Administrador) permite.
Um espaço perfeitamente adequado à muita conversa fiada, mentiras acreditáveis, ranhetices, rupturas, causos, crônicas e, sobretudo, área disponível aos amigos, uma turma cheia de gaiatices mas que eu adoro.
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quarta-feira, julho 28, 2004

Mané "Fala barata"

De todos os personagens da minha infância, um dos que mais me impressionou foi um tal de Manoel, português baixinho e roliço, cuja pitoresca, bucólica e quixotesca profissão de caixeiro-viajante, o conduzia por todo o sertão de Pernambuco e adjacências. Para os que não conhecem, um caixeiro-viajante nada mais é que um vendedor que percorre centenas de quilômetros pelas estradas interioranas, munido de um catálogo de produtos e um talonário de pedidos. Normalmente, representavam uma ou mais lojas de departamentos, produtores de cereais e grandes atacadistas. Feito o pedido, um caminhão da empresa repetia o percurso do vendedor, entregando as mercadorias aos comerciantes locais. Ainda hoje existe a profissão, atendendo, por exemplo, às pequenas cidades mineiras, paulistanas e fronteiriças, onde as vendas e mercearias fazem o comércio local. Pois bem: Manoel português era um desses vendedores. Vendia desde tecidos e panelas, a bebidas e velas, quando não um "fígado alemão" (espécie de charque de fígado bovino), em sua seção de secos & molhados. Não sei ao certo o ano, mas seu reinado durou grande parte da década de 50. Como a profissão de vendedor pressupõe o dom de bem palavrear, Manoel falava não só pelos cotovelos, mas também por todas as juntas do corpo. E segundo se conta, os assuntos eram tão sem propósito e tão variados que a "encheção de lingüiça" lhe rendeu o apelido de "Mané Fala Barata", ou seja, o que ele falava era assunto tolo, de pouca valia, era conversa fiada, barata e que, com o tempo, o tornaria talvez a figura mais folclórica do meio.
Vai daí que, como todo baixinho, Mané era folgado, condição básica pro sujeito meter-se em confusões insolúveis. E foi o que aconteceu numa das costumeiras paradas de viagem, no interior da Bahia. Chegou esbaforido numa bodega de beira de estrada, tonto de fome. A dona do estabelecimento, que já o conhecia, cumprimentou:
- Ô, "seu" Mané, como vai? Viajando muito, deve estar com fome...
- Pois é dona Zéfa, caindo de fome e sede...  - responde o homem.
- Apois, hoje tem uma sopinha de carne com legume, que tá uma beleza... Vai um prato fundo?
E responde Mané, alto em bom tom:
- Deus que me livre, dona Zefa... E eu lá sou porco pra tomar lavagem? Eu quero é comida de gente... E lá foi Mané, se ajeitar numa mesa de canto, enquanto um sujeito enorme, enchapelado, sorvia sonoramente um pratão da sopa de dona Zéfa. Sem levantar cabeça, instruiu, em voz grave:
- Ô dona Zéfa, pode de colocar um pratim dessa sopa aí pro moço, que ele hoje vai comer comida de porco sim... A mesma comida que o "porco" aqui está comendo...
E Mané tomou a sopa, em silêncio absoluto, como quem comunga uma hóstia em primeira comunhão...



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